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Por que a pecuária gasta R$ 15 bilhões por ano contra carrapatos

Um bovino afetado pode ter até 1.500 larvas espalhadas em seu corpo, que é a fase jovem do carrapatos quando sobe do pasto para o corpo do animal.

doença transmitida por carrapatos
Por que a pecuária gasta R$ 15 bilhões por ano contra carrapatos 2

Qualquer dono de animal de estimação, quase certamente, já enfrentou a dor de cabeça que o tratamento contra carrapatos pode trazer. Felizmente, uma rápida busca no Google mostra que os remédios contra esse parasita em animais domésticos dificilmente passam de R$ 100.

Mas esse problema não é tão barato e fácil de resolver no mundo da pecuária. Um bovino acometido pelo parasita pode ter até 1.500 larvas espalhadas em seu corpo, que é a fase jovem do carrapato, quando sobe do pasto para o corpo do animal. O fato é que esse “ataque” não sai barato.

Os pecuaristas brasileiros gastam cerca de R$ 15 bilhões anualmente em tratamentos, segundo Fernando Cardoso, chefe-geral da Embrapa Pecuária Sul (unidade da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), um dos principais centros de estudos do parasita, com sede em Bagé (RS). . ).

As despesas incluem os custos com medicamentos para eliminar o carrapato, medida vital para o bem-estar animal e a qualidade da produção de carne e leite.

Mas a Embrapa também trabalha com outra linha de ação: o melhoramento genético dos animais, tornando-os mais resistentes aos carrapatos. “Desenvolvemos formas de identificar, por meio de marcadores genéticos moleculares, quais animais transmitirão essa característica. [de resistência ao parasita] para a descendência das raças Angus Hereford, Braford e Brangus”, explica Cardoso.

“Nossa expectativa é que, com o efeito acumulado disso, tenhamos linhagens capazes de reduzir a infestação de carrapatos em raças taurinas que tenham essa característica de produzir carne de alta qualidade.” Os carrapatos atacam todos os tipos e raças de gado, mas são mais intensos em raças de origem europeia.

A solução, porém, está longe e não é tão fácil quanto parece. A seleção genética de bovinos é eficaz para melhorar a resistência a doenças, engorda mais rápida e sua rusticidade – como é o caso dos carrapatos –, mas não traz resultados tão rápidos. No entanto, a agilidade é um fator importante na saúde do animal, afinal, uma infestação de carrapatos pode causar ferimentos ao animal e até mesmo levar à morte, causando prejuízos ao produtor.

A MSD Animal Health, farmacêutica veterinária, é uma das empresas que inovou. Este ano, apresentou o composto fluralaner, primeira classe química contra carrapatos lançada desde 1982. “Esta nova molécula é capaz de atuar contra carrapatos que já são resistentes a classes químicas mais antigas”, explica Daniel Rodrigues, gerente técnico da unidade de ruminantes da MSD. A tecnologia foi desenvolvida e testada em fazendas no Brasil ao longo de oito anos e pode ser uma das formas de evitar os enormes gastos anuais dos pecuaristas. “Em geral, o trabalho nos mostrou que, para cada real investido em tratamento estratégico, você tem um retorno de R$ 4.”

Todo o trabalho de desenvolvimento de moléculas que componham drogas contra o parasita se baseia no fato de que as existentes podem se tornar resistentes devido ao uso inadequado, por exemplo, dose. Tal como acontece com muitos antibióticos em humanos. Não é por acaso que o desenvolvimento de produtos contra carrapatos não se restringe ao universo das grandes empresas.

As Agtechs, startups de tecnologia focadas na agricultura, estão nessa corrida. A Decoy, fundada em Ribeirão Preto (SP) pelos biólogos Lucas von Zuben e Túlio Nunes, é uma das primeiras empresas do mundo a desenvolver produtos de controle biológico que atuam nas fases em que o parasita está no animal e também no pasto.

Estima-se que 5% dos carrapatos estejam presentes nos animais e os outros 95% na área de pastagem das fazendas. Por isso, investem no uso controlado de fungos acaropatogênicos, inimigos naturais de aracnídeos como carrapatos, para tratar o problema em ambas as frentes. Mesmo com sua tecnologia ainda em fase de liberação de registro e testes nas fazendas, o tratamento já foi utilizado em cerca de mil propriedades e já beneficiou cerca de 100 mil animais e 10 mil hectares.

“Vemos esse movimento de controle biológico como um novo ecossistema emergente. Faço uma comparação com a transição do analógico para o digital”, diz Von Zuben.

“Essa transição do químico para o biológico que está ocorrendo em diversos segmentos, inclusive no agronegócio, traz uma série de oportunidades e várias empresas serão beneficiadas.”

Mas para que a implantação de tantas novas formas de tratamento, como Decoy e MSD, aconteça de forma efetiva, e mesmo para as já tradicionais moléculas, o setor precisa investir mais na capacitação de pessoas, segundo Octaviano Pereira Neto, veterinário e gerente técnico na Elanco, uma das principais farmacêuticas veterinárias do mundo, que também oferece soluções contra o parasita.

“Temos que começar a criar não especialistas em carrapatos, mas pessoas que entendam a dinâmica populacional do parasita para que possam tomar uma decisão e agir no momento certo”, diz Pereira Neto. “Infelizmente, hoje não falta investimento [em soluções], mas o investimento no lugar errado. Se eu não treinar a força de trabalho, as pessoas podem pensar que isso é apenas um problema para um veterinário ou um biólogo.”

A umidade e o calor são características climáticas ideais para a proliferação do carrapato, como acontece agora, a partir deste mês de setembro com o início da primavera e verão chuvosos, na maior parte do país onde há pecuária em escala. “Quando a água volta e o frio desaparece, ou diminui, isso faz com que o carrapato que está no degrau em forma de ovo, ecloda e libere suas larvas. Essas larvas sobem no animal, completam seu ciclo e caem novamente no chão. Cada carrapato fêmea que cai no chão produz 3.000 ovos”, diz Pereira Neto. “Então é um processo exponencial, porque com esse raciocínio, a cada mil carrapatos que caem no chão são três milhões de carrapatos que aparecem.”

O especialista faz a seguinte contagem no tempo. Sem nenhuma ação, desde o início das chuvas deste mês, um gado festonado tem o primeiro ciclo em setembro/outubro, a segunda geração em janeiro/fevereiro e a terceira em abril/maio, antes do início do inverno. “Então, em um rebanho, o primeiro produziu x milhões de carrapatos, o próximo são x bilhões e o próximo x trilhões”, diz ele. “É contra isso que o produtor luta e por isso temos que ter programas de controle que mantenham os animais limpos e diminuam a infestação no pasto. Compreender a dinâmica populacional para tomar uma decisão e ação no momento certo.”

O gerente da Elanco explica que o tratamento contra carrapatos envolve uma cadeia de compromissos na pecuária. “O produtor tem que entender que seu peão precisa ser treinado, então ele precisa disponibilizar o tempo do peão para que ele nos ouça e aprenda”, diz. A empresa realiza um programa de capacitação para combater o parasita desde 2007, treinando cerca de 200 pessoas por mês, o que dá cerca de 2.400 pessoas por ano. “Você pode ter o melhor produto do mundo, mas ele se extingue se você não investir em treinamento de pessoas.”

O esforço é geral. Segundo Rodrigues, da MSD, a empresa conta com um grupo de 200 veterinários treinados para ensinar os pecuaristas a usar sua nova molécula para evitar que os parasitas criem resistência ao tratamento. “Tudo isso é uma forma de trazer mais longevidade à molécula. Porque, se você orientar o pecuarista sobre como usar e a hora certa de usar, você finalmente controla a questão da resistência para aquela área.”

O investimento na educação de pecuaristas e trabalhadores não precisa ser exorbitante para surtir efeito. Na montanha monumental de dinheiro gasto contra o parasita, treinar a força de trabalho e os tomadores de decisão pode ser a parte mais acessível da despesa. As grandes empresas do setor veterinário seguem essa linha, como relata Pereira Júnior, afirmando que a parte mais sensível do controle parasitário é a aplicação correta dos medicamentos no campo.

Além das equipes de campo das empresas, existem outros mecanismos nessa educação. A Embrapa, por exemplo, encerrou este mês o período de inscrição para sua quinta turma de 2022 do curso de controle estratégico de carrapatos de gado leiteiro. Ao custo de R$ 39,90 por 30 horas de conteúdo, a entidade ensinará, até outubro, como realizar o teste de sensibilidade do carrapato a acaricidas e ainda indica 10 passos para o sucesso do controle parasitário.

Fonte: Forbes

 



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