O aumento da concentração de gases de efeito estufa (GEE) na atmosfera, normalmente denominado dióxido de carbono equivalente (CO2 eq) é inequivocamente causado pela atividade humana, principalmente pela queima de combustíveis fósseis, desmatamento e queima de vegetação nativa.
É possível calcular as emissões desses dois setores, pois sabemos quanto combustível fóssil é consumido a cada ano e qual é a taxa de conversão em CO2, o mesmo ocorrendo com o desmatamento desenfreado e a queima de material vegetal. Nem todo o dióxido de carbono emitido vai para a atmosfera, cerca de 57% das emissões permanecem no ar. O restante é parcialmente absorvido nos oceanos e outra parte é utilizada na fotossíntese, sendo uma parte fixada na biomassa por períodos de tempo variáveis.
Um pouco de história
O estudo da relação entre as emissões de GEE e as mudanças climáticas tem quase dois séculos. Um dos primeiros estudos sobre o assunto deve-se a Eunice Foots, cientista americana. Ela publicou no The American Journal of Science and Arts, em 1856, um experimento simples. Ela encheu três copos de vidro – um com vapor, um com CO2 e um terceiro com ar, observando como eles se comportavam quando expostos ao sol. O vidro com dióxido de carbono aqueceu muito mais que os outros e levou mais tempo para esfriar. Este estudo é a base para demonstrar o efeito estufa, modulado pela composição de gases e vapor d’água na atmosfera.
Aproximadamente na mesma época, e sem conhecer o trabalho de Eunice, o irlandês John Tyndall demonstrou como certos gases, incluindo o CO2, capturam calor na atmosfera, publicando seus estudos em 1859. Outro pioneiro foi o cientista sueco Svante Arrhenius que, em meio a XIX, calculou o impacto teórico de um aumento de CO2 na atmosfera. Ele estimou que dobrar a concentração de CO2 na atmosfera poderia aumentar a temperatura média do planeta em até 6°C.
Há cerca de 70 anos, um químico americano, Charles Keeling, observou o intenso aumento da concentração de CO2 na atmosfera. Como resultado de seus estudos e sua persistência, instituições norte-americanas, como universidades e a Agência Nacional para os Oceanos e a Atmosfera (NOAA), começaram a registrar níveis de dióxido de carbono na atmosfera. Em homenagem ao pioneiro, esse registro ficou conhecido como a Curva de Keeling. O avanço da curva ao longo do tempo pode ser verificado em keelingcurve.ucsd.edu.
O presente
O Observatório Mauna Loa da NOAA, localizado no flanco norte do extinto vulcão de mesmo nome no Havaí, a uma altitude de 3.397m acima do nível do mar, é o ponto de referência para estimar a concentração atmosférica de CO2. O local foi escolhido por ser distante de grandes centros urbanos e locais com fortes emissões de GEE, para evitar distorções e verificar como as emissões, embora localizadas, seriam distribuídas na atmosfera global. A informação para estabelecer a Curva de Keeling vem deste observatório.
Os cientistas estimam que a concentração de CO2 atmosférico já foi maior do que atualmente, mas isso foi há muitos milhões de anos. Como a queima de combustíveis fósseis não é natural, os recentes aumentos de carbono na atmosfera, nos oceanos e na biosfera terrestre também não podem ser naturais. O que mais chama a atenção dos cientistas não é tanto a concentração de dióxido de carbono – embora muito alta -, mas a taxa de aumento, que nada tem a ver com o passado recente, digamos, os últimos 800 mil anos. Poucos processos naturais podem liberar carbono fóssil na atmosfera tão rapidamente quanto nós humanos estamos fazendo agora com a extração e uso de combustíveis fósseis, desmatamento e queima de vegetação nativa.
Na década de 1990, a sociedade global começou a se preocupar com o aquecimento global. Atualmente, o clima é monitorado por inúmeros satélites e milhares de termômetros em todo o mundo. E o monitoramento não é feito apenas por questões científicas ou ambientais, o impacto social e econômico tem sido muito intenso.
Nos últimos anos, nos Estados Unidos, as mudanças climáticas foram apontadas como responsáveis por reduções do PIB da ordem de US$ 1,3 trilhão. Somente em 2018, as perdas foram estimadas em US$ 80 bilhões. Embora não existam estudos em nível global, estima-se que esse impacto chegue a trilhões de dólares (https://impactlab.org/).
As propostas para evitar uma catástrofe que se avizinha incluem a redução do uso de combustíveis fósseis, a eliminação da queima desnecessária de vegetação nativa e a redução da pegada climática da pecuária.
Enquanto isso, a solução enfrenta o negacionismo científico daqueles que insistem em negar as mudanças climáticas, apesar de todas as evidências em contrário. Além disso, há inúmeros interesses econômicos formidáveis em jogo, como a produção e uso de petróleo, gás e carvão, e a extração ilegal de madeira nas florestas remanescentes. Sem um compromisso global de todos os atores sociais e econômicos, o preço que as próximas gerações pagarão será muito alto, talvez até impossível de pagar.
O autor é Engenheiro Agrônomo, pesquisador da Embrapa Soja e membro fundador do Conselho Agro Sustentável.
Concentração de CO2 na atmosfera, medida no observatório Mauna Loa.
Crédito: Laboratório de Monitoramento Global ESRL – Observatório Mauna Loa (noaa.gov)
Concentração de CO2 na atmosfera, contrastando os dados arqueológicos (1700-1950) com os medidos no observatório de Mauna Loa desde 1960.
Crédito: Laboratório de Monitoramento Global ESRL – Observatório Mauna Loa (noaa.gov)
Concentração de CO2 na atmosfera, contrastando dados arqueológicos (até 800.000 anos antes de 2022) com os medidos no observatório de Mauna Loa a partir de 1960.
Crédito: Laboratório de Monitoramento Global ESRL – Observatório Mauna Loa (noaa.gov)
Por Décio Luiz Gazzoni, membro do Conselho Científico Agro-Sustentável