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Onde as vacas gostam de parir?

Um experimento realizado pela UFMS mostra que a presença de vegetação nativa nas pastagens escolhidas para o parto favorece a mãe e aumenta o vigor do recém-nascido

Vaca parindo debaixo de árvores, na Fazenda Campina, em Campo Grande (MS).
Por Carolina Rodrigues

Para que um bezerro inicie sua vida da melhor maneira possível, é essencial garantir à vaca um ambiente confortável para parir. A questão é: quais elementos esse local (piquete da maternidade) deve ter para que o parto ocorra da forma menos estressante possível?

Um estudo realizado pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) com observações de partos, em duas fazendas do estado, chegou à seguinte conclusão: a vaca busca privacidade e conforto térmico ao parir, escolhendo preferencialmente matagais ou fragmentos de vegetação nativa. pastagens para ter seus filhotes, o que reduz os problemas de parto e também favorece o desenvolvimento do bezerro nas primeiras horas de vida.

O experimento foi realizado com 60 vacas Nelore e 1/2 sangue Nelore/Angus. De acordo com Eliane Vianna da Costa e Silva, professora e pesquisadora da UFMS, seus resultados podem ajudar o produtor a “planejar” piquetes de maternidade mais adequados para a dupla vaca-bezerro, alterando o “modo de operação” de criatórios brasileiros, onde as vacas são colocadas para parir em áreas descobertas e próximas ao curral, para facilitar o manejo.

O estudo mostrou que a presença de árvores na pastagem-maternidade, além de garantir um “refúgio” para as vacas, proporciona-lhes conforto térmico, além de promover melhor interação entre elas e seus filhotes, condição básica para que o bezerro mostrar vigor de nascimento a nascimento. primeira mamada, que deve ocorrer dentro de quatro horas após o parto. A rápida ingestão de colostro é essencial porque, além de ser a primeira fonte de nutrientes para o bezerro recém-nascido, também permite “proteger” o animal contra infecções, pois ativa seu sistema imunológico.

Eliane Costa
Eliane Vianna da Costa e Silva, professora da UFMS.

Dados da UFMS mostram que mais da metade das mortes de bezerros nas propriedades brasileiras ocorrem nas primeiras 48 horas de vida e estão correlacionadas com o comportamento materno em relação ao bezerro. “Além da questão do bem-estar animal, o manejo inadequado ao nascimento causa danos ao bezerro. Hoje, muitas propriedades possuem árvores isoladas nas pastagens, mas a maioria morre com o tempo ou não garante o abrigo buscado pelas vacas. O ideal é formar bosques, que também favoreçam a fauna local”explica Eliane, que orientou a mestranda Danaila Bruneli Fernandes Gama, responsável pela execução do trabalho.

ambiente experimental

As propriedades escolhidas como “laboratório” para o experimento possuíam pastagens-maternidade com áreas descobertas, mas também com bosques ou fragmentos de vegetação nativa, o que possibilitou avaliar o comportamento animal. Na Fazenda Campina, localizada no município de Campo Grande (MS), foram observados 23 partos de vacas Nelore pluríparas. Na Fazenda Sete Estrelas, em Terenos, o total de partos foi maior: 42, registrados em 10 primíparas e 10 multíparas 1/2 sangue Angus, mais 22 pluríparas Nelore.

Em Campina, especificamente, onde havia partos noturnos, todas as porcas Nelore acompanhadas por Danaila procuravam locais arborizados para ter seus filhotes, provavelmente na tentativa de proteger a si e seus filhotes do frio, vento e chuva, já que o parto temporada na fazenda coincidiu com o inverno (julho/agosto).

Na Fazenda Sete Estrelas, onde a estação reprodutiva foi de setembro a novembro (estação mais quente), 12 das 22 vacas Nelore paridas ocorreram a campo aberto, mas o contrário aconteceu com as cruzadas: todas optaram pelo sombreamento na momento do parto. Ao todo, 30 dos 42 partos observados na propriedade (71,4%) ocorreram em bosques, ou seja, em locais sombreados.

Nesses locais, as condições climáticas favoreceram o conforto dos animais, conforme demonstrado pelo Índice de Temperatura e Umidade (ITU), medido no experimento com base em dados da estação meteorológica próxima. De acordo com referências utilizadas em países temperados, um ITU superior a 70 indica que os animais podem estar fora da zona de conforto térmico, o que, em teoria, já afetaria o bem-estar da porca ao nascimento e também a sua interação com a prole. . Na faixa de 71 a 78, a situação é considerada crítica. Acima de 83, é uma emergência.

Experimento Eliane scaled
Uma boa relação vaca-bezerro é essencial para reduzir a taxa de mortalidade nos primeiros dias de vida.

ambiente experimental

Danaila Gama
Danaila Gama, mestranda da Universidade Federal de MS.

No caso do Nelore, os animais apresentaram ITU crítica para frio a partir de 62° (abaixo de 25°) no parto, confirmando que os bezerros desta raça são menos adaptados a temperaturas mais baixas, em comparação aos mestiços. Danaila explica que as baixas temperaturas, associadas à maior umidade do ar, aumentam o tempo que o bezerro leva para ficar em pé e tentar mamar (latência). “A diferença de tempo de latência entre o grupo nascido em campo aberto e o grupo nascido em áreas sombreadas foi grande, chegando a 80 minutos nos animais mais lentos”informa Danila.

Os resultados, segundo a professora Eliane, emitem um alerta: “Muitas pessoas pensam em estresse térmico em taurinos ou mestiços, considerando que o Nelore é uma raça adaptada. É verdade, mas procura sombra nos dias mais quentes e, quando ocorrem temperaturas mais baixas (como no sul do MS), precisa de vegetação para se proteger do frio e muitas vezes não a encontra”.

Outros experimentos da UFMS com Nelore já confirmaram queda na qualidade do sêmen de animais Nelore submetidos ao frio e perda de viabilidade embrionária nas fêmeas. Agora, um efeito negativo também foi observado no comportamento materno-filial ao nascimento.

O pesquisador conta que, no caso dos Cruzados, o Índice de Temperatura e Umidade (ITU) considerado crítico estava relacionado ao calor. No experimento, os animais apresentaram extremo desconforto acima do ITU 78, apresentando alterações nas frequências cardíaca e respiratória, e glicemia elevada nos bezerros. “Estes são indicadores claros de estresse por calor, que pode levar a uma maior taxa de infecções bacterianas ou virais”, diz Eliane. A avaliação desses parâmetros fez parte da tese de Liss Fioravanti Lavra, que complementou o trabalho de Danaila Gama.

Proteção e recomendações

A pesquisa também mostrou outras vantagens de ter uma arquitetura rica em estratos arbóreos nos piquetes da maternidade. Além de proporcionar uma barreira contra o frio e o calor, as árvores ajudam a prevenir ataques de aves de rapina, principalmente urubus, segundo a professora Eliane. “A vegetação tem um efeito benéfico quando os bezerros nascem. Servem também como proteção contra predadores, que podem causar danos físicos aos bezerros e, em casos mais graves, até a morte.”diz.

Na Fazenda Campina, a área do experimento contou com 16 pequenas matas e uma de 95.324 m². A Sete Estrelas possuía três pastagens maternidade (uma para cada categoria matriz), totalizando quase 200 árvores e 11 pomares (3.804 m² de sombra). Segundo a pesquisadora da UFMS, o fato de as vacas escolherem preferencialmente matos para parir está ligado à habilidade materna, já que a presença de duas ou mais árvores juntas aumenta a sensação de proteção ao bezerro.

Diante dos resultados, ela aconselha o produtor a escolher locais com vegetação nativa nas áreas de maternidade ou investir em sistemas integrados pecuária-floresta (IPF). Para Eliane, o ideal é que essas pastagens tenham árvores isoladas, bosques e áreas de campo como componentes “obrigatórios”.

O experimento mostrou que, em locais com árvores isoladas, há uma diminuição de até 2,8°C nos períodos mais quentes do dia. Na mata, a temperatura pode cair entre 0,3 e 15,7°C. O pesquisador espera que o experimento também estimule a formação de pomares de espécies arbóreas do Cerrado em pastagens, ajudando a preservar a vegetação nativa da região.

Leia a Revista DBO de outubro AQUI.

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