Este é o primeiro mercado regulamentado de crédito de carbono no Brasil, operando sob a lógica de formação de um mercado organizado de certificados de descarbonização (CBIO), lastreado no teor de carbono dos biocombustíveis.

Baseia-se em três instrumentos principais: metas anuais de redução da intensidade de carbono (gCO2eq/MJ) da matriz de combustível de transporte por um período de 10 anos; certificação de biocombustíveis por meio da Nota de Eficiência Energético-Ambiental (NEEA); e um mercado para CBIOs.

Quando analisamos os objetivos do RenovaBio, o primeiro e o segundo objetivos são de natureza ambiental; e o terceiro e quarto, de natureza setorial. No entanto, há um descompasso entre esses dois eixos (ambiental e setorial) com as políticas de Estado mais amplas.

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No caso ambiental, ainda não há definição de qual seria a contribuição ideal de cada setor da economia para reduzir as emissões, a fim de cumprir os compromissos do Acordo de Paris da forma mais eficiente e com o menor impacto social.

Integração de políticas climáticas

Os estudos sobre Opções de Mitigação em Setores-Chave da Economia e o PMR Brasil foram os únicos que trataram do tema no governo federal.

No entanto, o RenovaBio foi aprovado por lei e parcialmente regulamentado antes dos resultados desses estudos, o que permitiria uma análise de custo-benefício das alternativas e inserção em programas intersetoriais.

No caso de objetivos setoriais, o RenovaBio não faz parte de uma política industrial mais ampla, o que o torna: mais sujeito a sinais contraditórios ao interagir com outras políticas e mais vulnerável ao lobby setorial.

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Na prática, não houve análise prévia das alternativas que pudessem alcançar resultados transversais ao menor risco de forma integrada, com ganhos de escala dos aspectos ambientais e setoriais. Resultados claros podem ser vistos no setor sucroenergético, mas não divulgados em outros setores.

Ainda no que diz respeito à implantação do RenovaBio, a governança na definição das metas de aquisição de CBIOs pelas distribuidoras de combustíveis é atribuída ao Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) com base na recomendação do Comitê RenovaBio, apoiado pelo Comitê Interministerial de Mudança no Clima (MIC).

Nesse sentido, o Ministério de Minas e Energia (MME) e a Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANP) construíram, sob a tutela do CNPE, toda a regulamentação necessária.

Do ponto de vista microeconômico, o mercado de CBIO é marcado por um número de fornecedores (>400) maior que o número de demandantes (<200) e o total de emissões equivalentes, consideradas para fins de estabelecimento de metas, decorrentes de combustíveis fósseis líquidos , que totalizou 204,06 megatons de CO2eq (MtCO2eq) em 2021, o que denota a “pegada de carbono” do setor de transportes.

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Interferência no mercado CBIO

Ao colocar uma lupa nas metas, de fato, apenas 17,6% da pegada são realmente compensados ​​pela meta de aquisição de 35,98 milhões de CBIOs, prevista para 2022.

Portanto, a contribuição para o Acordo de Paris do setor de petróleo e gás (upstream), refino e distribuição (downstream) ainda é muito limitada, deixando cerca de 168,1 MtCO2eq a descoberto para medidas compensatórias, que devem ser compensadas, por exemplo. , para compras no mercado voluntário de créditos de carbono para atingir o status de carbono líquido zero do setor.

A previsão de entrada em operação de cerca de 50 usinas de etanol (milho e cana-de-açúcar) dá uma dimensão do que está por vir. Excesso de oferta de CBIOS.

Se o MME já tiver dificuldade em avaliar o que realmente está acontecendo no atual boom de preços do CBIO, talvez precise examinar mais sua capacidade de desenvolver inteligência de mercado.

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A meta de 35,98 milhões de CBIOs representa uma redução de 27,8% em relação à meta previamente projetada para o mercado em 2019.

O preço médio da CBIO em 2020 foi de R$ 33,32/CBIO e em 2021 foi de R$ 34,77/CBIO. Em 2022, o preço médio subiu para R$ 106,97/CBIO.

A partir da edição do decreto 11.141, de 21 de julho de 2022, a meta de 2022 foi postergada para 30 de setembro de 2023, resultando em uma redução brusca do preço à vista do CBIO de R$ 209,50/CBIO, em 30/06/2022, para R$ 90,63/CBIO, em 19/08/2022, conforme dados da B3.

Intervenções desse tipo podem comprometer os resultados do RenovaBio ou sinalizar um alerta para a necessidade de novos instrumentos regulatórios que obedeçam a uma lógica de mercado.

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RenovaBio e o mercado regulado de carbono

Em termos de política climática, o RenovaBio teve uma ascensão meteórica não apenas pela rápida aprovação legislativa, mas também pela alta participação do setor.

A mesma história meteórica pode se repetir com o Mercado Brasileiro de Redução de Emissões (MBRE), regulamentado pelo decreto 11.075, de 19 de maio de 2022, dado o claro apoio dos setores industriais e dos mercados financeiro e de capitais.

No entanto, ainda persiste a mesma ausência de uma análise mais sistêmica e integrada, seja com o RenovaBio ou com a Política Nacional de Mudanças Climáticas (PNMC).

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O MBRE é um sinal importante no sentido de estabelecer um preço para as externalidades negativas das mudanças climáticas, mas que é claramente extemporâneo, pois não esperou as discussões em curso no Congresso Nacional sobre o assunto e demonstra um relativo amadorismo do Ministério do Meio Ambiente (MMA).

O decreto regulatório do MBRE nem sequer menciona o RenovaBio, nem define uma entidade governamental reguladora, nem indica os mecanismos de funcionamento do MBRE, o que coloca o MMA em relativa desvantagem em relação ao MME no desenvolvimento de instrumentos desse tipo.

Outra questão relevante é a opção por uma solução de mercado para a precificação do carbono, que inclui uma armadilha, definida pela forte flutuação que os créditos de carbono podem atingir.

Se as lições aprendidas com os três ciclos do mercado de carbono europeu (Emissions Trade Scheme – ETS), que terminou em 2020, não forem assimiladas, voltaremos a cair no velho princípio da dependência da trajetória, em que os erros do passado continuarão a ser feito no futuro, desnecessariamente.

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Os preços do carbono no ETS atingiram valores inusitados nos últimos meses, em linha com a evolução dos preços da eletricidade e do petróleo após o início da Guerra da Ucrânia.

O mesmo movimento pode ter ocasionado o aumento dos preços da CBIO e, possivelmente, a não manipulação de preços por parte das plantadoras de etanol e biodiesel, como alegaram entidades de classe a jusante.

No entanto, vale destacar que o MBRE é a opção que oferece maior agilidade aos agentes obrigados (regulamentados) e conta com o apoio do Centro Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS).

O Projeto PMR Brasil recomendou sua instituição ancorada na gestão ministerial, entre os membros da CIM, com estreita participação privada nos processos de revisão e suporte técnico para tomada de decisão, verificação de inventários de emissões de GEE, planos de monitoramento e operação da plataforma eletrônica de transação.

Outro ponto relevante para a constituição do MBRE é a definição regulatória do ativo “certificado de carbono”.

A posição atual do Banco Central do Brasil (BCB) e da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) é reconhecê-la como commodity, assim identificada para a CBIO. No entanto, a Lei 12.187/2009, que instituiu o PNMC, o reconhece em seu art. 9º como uma “segurança segura” indo de encontro ao posicionamento desses órgãos reguladores.

Portanto, não será tirando força do RenovaBio ou promovendo uma implementação desrespeitada do MBRE que construiremos uma política de Estado de mitigação e adaptação às mudanças climáticas.

Vale repensar os erros e acertos da precificação do carbono ao redor do mundo e buscar uma integração das políticas públicas e não a perpetuação da fragmentação das ações relacionadas ao tema, caso contrário pagaremos um custo desnecessário por falhas governamentais.



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