Identificando a mastite e protegendo o gado na pecuária de leite

Identificando a mastite e protegendo o gado na pecuária de leite

Confira a entrevista Scot Consultancy com o zootecnista Petterson Sima sobre a mastite, doença que atinge o gado leiteiro:

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Scot Consultoria: Como é possível diagnosticar a mastite clínica e a mastite subclínica?

Peterson Sima: A mastite clínica é mais fácil de perceber, pois o leite apresenta grumos visíveis com o auxílio do teste da caneca de malha (ou caneca com fundo preto). Em casos mais graves, pode haver pus ou sangue no leite, além de o úbere ficar inflamado, intensificando os danos e, em alguns casos, inutilizando o espaço mamário. É muito importante que o teste da xícara seja feito antes de cada ordenha e em cada vaca. Lembrando sempre que devem ser retirados três jatos de leite, o que garante um diagnóstico eficaz e a exclusão de leite residual contaminado.

A mastite subclínica é silenciosa, dificultando sua detecção a olho nu. Devido à falta de sinais evidentes da doença, são necessários testes auxiliares para o diagnóstico da Contagem de Células Somáticas (CCS) no leite, por meio de exames clínicos na própria fazenda, com ferramentas de contagem eletrônica ou reagentes químicos para estimativas ou análises laboratoriais de alta precisão das amostras de leite. Mas, para que haja uma análise assertiva e confiável, é importante que ela seja realizada em laboratórios credenciados pelo MAPA. Tecnicamente, considera-se que vacas saudáveis ​​têm contagens de até 200.000 células/ml.

Scot Consultoria: Como é possível proteger o gado leiteiro da doença?

Peterson Sima: A mastite é uma doença multifatorial, ou seja, existem várias causas para sua incidência, como baixa imunidade, desnutrição, estresse térmico devido ao calor, trauma, máquina de ordenha sem revisão periódica, estresse, entre outros. Mas os fatores mais importantes na proteção do gado leiteiro contra doenças são a rotina de ordenha e os cuidados com as tetas antes e depois da ordenha.

Conhecidos como pré e pós-dipping, os procedimentos de preparo das tetas do úbere, com auxílio de soluções químicas especializadas antes e após a ordenha, trazem benefícios à saúde das vacas e ao bolso do produtor de leite. A promoção de tetas livres de contaminantes e pele saudável tem um impacto direto na prevenção da mastite e na melhoria dos índices de CCS e TBC (Contagem bacteriana total).

O sistema mais utilizado no Brasil é realizado com produtos líquidos ou em espuma aplicados nos tetos por 30 segundos e enxugados/limpos com papel toalha. É um bom método, mas apresenta limitações, principalmente na limpeza e massagem estimulante dos tetos. A melhor forma de remover a sujeira é com toalhas de pano embebidas em soluções desinfetantes que não agridam a pele. Além disso, os produtos pré-dipping devem conter componentes cosméticos para melhorar a saúde da pele.
Orientações técnicas específicas para cada fazenda são de extrema importância. Não existe apenas uma receita para todas as fazendas.

Scot Consultoria: O Brasil é o terceiro maior produtor de leite do mundo, segundo o MAPA. Quais os prejuízos que a mastite pode causar à produção leiteira?

Peterson Sima: Atualmente, produzimos algo próximo a 34 bilhões de litros de leite por ano. Com o nível médio de CCS estimado no Brasil, em torno de 500.000, podemos considerar que deixamos de produzir pelo menos 1,75 bilhão de litros por ano, correspondendo a 5% da produção. Este é um valor conservador. Isso significa quase 5 bilhões de reais a menos por ano, mas pode ser muito mais.

Pesquisa recente da ESALQ observou dados do SEBRAE-MG de 2015-2017, com mais de 500 fazendas em Minas Gerais com produção média geral de 17 litros/vaca/dia nos últimos anos. Produtores com média de 15 e 17 litros/dia/vaca tiveram CCS acima de 500 e 750 mil, respectivamente. Por outro lado, fazendas com CCS médio abaixo de 200.000 produziram 20,5 litros/vaca/dia. A diferença de custo por vaca entre esses grupos não foi muito maior. As fazendas com maior CCS (>750 mil) investiram apenas 400 reais a menos/vaca/ano, em comparação com as melhores fazendas (<200 mil).

Por outro lado, a diferença de lucro entre essas mesmas fazendas foi superior a 700 reais/vaca/ano, sendo que as fazendas com mais de 750.000 CCS tiveram prejuízo.
Embora o produtor ache que perde dinheiro com medicamentos e descarte de leite, 70% de sua perda anual se deve à perda de produção de leite devido à mastite clínica e, principalmente, subclínica.

Scot Consultoria: Métodos preventivos para mastite são mais viáveis ​​financeiramente do que tratamento e possível perda de tetas, certo? Então, por que vemos tantos casos que não poderiam ter ocorrido com a prevenção correta?

Peterson Sima: A perda de um ou mais tetos é possível. Ainda temos uma forte cultura de má saúde nas fazendas. Muitas técnicas, surgidas nos últimos 20 anos, ainda são consideradas desnecessárias ou “bobas” por muitos produtores. O grande problema está relacionado à informação. Muitas propriedades não têm gestão empresarial, não tratam a fazenda como uma empresa, um negócio de verdade. Grande parte não sabe dizer quanto gasta para produzir 1 litro de leite, por exemplo.

É necessário coletar e organizar todos os dados que a fazenda possui, técnicos e financeiros. Depois, analisar os dados é tão importante quanto coletá-los. Entenda onde estão os gargalos, perdas e oportunidades. Somente com dados é possível perceber o real prejuízo. Para que o produtor se convença de que a prevenção é mais barata e mais eficiente que o tratamento, são necessários dados fidedignos e análises adequadas.

Isso vale para produtos e ferramentas de prevenção e cura. Optar sempre por comprar produtos mais baratos e contratar serviços é o famoso “barato que sai caro”. Por não analisarem as informações da produção de leite, a maioria nem sabe que os custos com higiene, revisão das máquinas de ordenha e ferramentas de controle da mastite dificilmente ultrapassam 3% do custo total da fazenda. É um investimento baixo em comparação com o enorme benefício.

Por isso existem técnicos, de empresas privadas e órgãos públicos, que dão orientações técnicas para melhorar o sistema de produção, sanidade e qualidade do leite. Não existe milagre! Basta aplicarmos as conhecidas técnicas e práticas eficientes.

Scot Consultoria: A higiene durante a ordenha é um passo importante na prevenção da mastite. O uso de pré e pós-dipping já é difundido em todas as fazendas leiteiras?

Peterson Sima: Infelizmente não. Muitas fazendas ainda não utilizam tais ferramentas ou mesmo utilizam produtos com baixo desempenho, com formulações caseiras de baixa eficiência na limpeza, desinfecção e/ou cosmética, mas, certamente, houve claros avanços nos últimos anos. O entendimento sobre o controle da mastite é cada vez maior no mercado, entre produtores e técnicos, e, cada vez mais, estamos adotando práticas e tecnologias eficazes, nos aprimorando.

É um caminho sem volta. Os produtores que perceberam os benefícios da tecnificação aumentaram suas taxas de produção e lucratividade. Outros seguirão o exemplo. O mercado exigirá cada vez mais o controle de doenças, melhoramento genético, eficiência produtiva e redução de perdas. Não tenho dúvidas de que, em poucos anos, seremos não apenas um dos maiores produtores de leite, mas cada vez mais uma referência mundial em sistemas de produção eficientes e rentáveis. Isso ocorrerá concomitantemente com a melhoria dos conceitos de biossegurança nas fazendas leiteiras.

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