Os plásticos são parte integrante da economia global e da vida cotidiana de cada um de nós. A produção global de plástico atingiu 38 Mt em 2021, o que deve crescer substancialmente na presente década, enquanto as taxas de reciclagem devem permanecer baixas (bitly.ws/snQZ). Essa falta de reciclagem, aliada à alta durabilidade dos plásticos, resultou em uma ampla gama de impactos ambientais negativos (bitly.ws/snR6).
O aumento da poluição produzida pelos plásticos é um grande problema ambiental, e uma forma de combatê-lo é adotar uma economia circular, em que os materiais utilizados são reciclados. Um passo importante para facilitar esse processo é inventar novas abordagens para a reciclagem de resíduos plásticos em produtos de consumo desejáveis. A degradação e a conversão microbiana do plástico provavelmente desempenharão um papel considerável na construção de uma economia circular, usando microorganismos ou suas enzimas para reciclar resíduos plásticos.
Um dos polímeros mais prevalentes em todo o mundo é o poliestireno termoplástico durável (PS), que responde por até 10% da produção total de plástico não fibroso (bitly.ws/snRe). Dentre os diversos tipos de PS, a espuma é a mais utilizada em produtos de consumo, sendo conhecida como isopor. Como outros plásticos, o PS persiste na natureza por décadas e pode prejudicar a vida selvagem e os seres humanos.
Biodegradação de plásticos
Um primeiro passo para atingir esse objetivo é identificar micróbios que podem degradar o poliestireno e investigar as enzimas e vias envolvidas. O microbioma de insetos demonstrou ser particularmente útil para a biodegradação de plásticos. Aí está a oportunidade gerada pela crise. Listaremos, a seguir, diversos estudos de biodegradação de PS utilizando insetos, na certeza de que os estudos iniciais se estenderão a outros tipos de plásticos.
Até o início do século 21, o PS era considerado recalcitrante a micróbios (bitly.ws/snRu), razão pela qual os estudos de degradação do PS se concentravam principalmente em processos químicos ou mecânicos. De fato, o alto peso molecular e o caráter hidrofóbico dos polímeros PS os tornam um alvo difícil para biodegradação, pois são menos suscetíveis à hidrólise, que é a principal via de degradação natural do polímero. Mas estudos também mostraram que a degradação abiótica inicial do PS (química ou por fragmentação) aumenta a biodisponibilidade do polímero no meio ambiente, criando superfícies ou substâncias mais expostas à biodegradação.
Nas últimas décadas, vários isolados microbianos têm sido relatados usando PS como fonte de carbono, embora em ritmo lento, com taxas que variam de 0,13 a 7% ao dia. Estudos mostraram que comunidades mistas de microrganismos, encontradas em solos e culturas, foram capazes de degradar PS. Da mesma forma, consórcios microbianos marinhos reduziram efetivamente o peso dos filmes de PS, sugerindo que eles são capazes de degradar peças de PS intemperizadas (http://bitly.ws/snRD).
Biodegradação por insetos
Pesquisas envolvendo microbiomas intestinais de insetos estão mostrando o potencial mais promissor para a degradação eficiente do plástico, combinando mecanismos físicos e bioquímicos. O inseto usa a força mecânica de seu aparelho de mastigação para quebrar o plástico em pequenas partículas, facilitando sua biodegradação pela comunidade microbiana no trato digestivo.
Estudos recentes relataram que os microbiomas de insetos são capazes de biodegradar o plástico. Duas cepas bacterianas, Enterobacter asburiae YT1 e Bacillus sp. YP1, isolado do intestino da mariposa indiana, Plodia interpunctella, foi capaz de degradar eficientemente o polietileno (bitly.ws/snSN).
O microbioma intestinal mais bem caracterizado de insetos degradadores de plástico é o de larvas de farinha, Tenebrio molitor (bitly.ws/snSW). Suas larvas foram capazes de sobreviver em PS como sua única dieta. A degradação de moléculas de PS de cadeia longa resultou em metabólitos despolimerizados. A maioria do PS foi convertida em CO2 (47,7%) ou expelida do corpo nas fezes (49,2%), com apenas uma quantidade limitada (0,5%) sendo incorporada à biomassa do inseto. O dióxido de carbono pode ser capturado em câmaras de crescimento de insetos e imobilizado de outras maneiras. O microbioma intestinal foi considerado essencial para a quebra do PS, pois as larvas da farinha, tratadas com antibióticos, perderam a capacidade de despolimerizar o PS.
Outro estudo, envolvendo uma cepa de Exiguobacterium sp. isolado de um intestino de cascudinho, demonstrou a formação de um biofilme no PS e foi capaz de degradar 7,4% do PS durante um período de incubação de 60 dias. Outro estudo, investigando a degradação de PS e plásticos mistos (PE) em T. molitor, obteve taxas de biodegradação comparáveis, envolvendo a bactéria Citrobacter sp. e Kosakonia sp., que foram associados à degradação de PE e PS (bitly.ws/snTD.
super vermes
Supervermes é um nome comum para as larvas da larva da farinha gigante (Zophobas morio), que também sobreviveu em PS como a única dieta (bitly.ws/snU3). As larvas converteram 36,7% do carbono PS ingerido em CO2. Assim como com T. molitor, a capacidade de degradação do PS dos supervermes foi inibida pela supressão da microbiota intestinal com antibióticos, enfatizando a importância do microbioma intestinal na degradação do PS.
Cientistas da Universidade de Queensland (Austrália) também relatam a degradação do poliestireno, com a ajuda de bactérias do microbioma intestinal da cochonilha gigante, com 95% de sobrevivência dessas bactérias, alimentando-se exclusivamente de PS. O estudo foi muito aprofundado, sendo a primeira análise metagenômica de um microbioma de inseto associado ao plástico, revelando uma enorme diversidade de bactérias presentes no intestino do inseto, que podem estar associadas à degradação do OS (bitly.ws/snRK).
Há um avanço animador na possibilidade de usar insetos para biodegradar plásticos, aproveitando também os produtos dessa degradação. Esta é uma oportunidade interessante para empreendedores que queiram investir na área, desde que as políticas públicas apontem claramente para a necessidade de complementar a reciclagem do plástico, que, até o momento, não respondeu ao desafio de solucionar a poluição causada pelo plástico, que pragas e ameaça o meio ambiente global.
Por Décio Luiz Gazzoni, Engenheiro Agrônomo, pesquisador da Embrapa e membro fundador do Conselho Científico Agro-Sustentável