A comunidade internacional está dizendo que a carne bovina brasileira é produzida às custas da degradação florestal. Mas você sabe como é produzida a carne brasileira?
A comunidade internacional está dizendo que a carne bovina brasileira é produzida às custas da degradação florestal Amazônia, mas o que a sociedade brasileira pensa da nossa carne bovina? Você sabe como é produzida a carne brasileira? Todas as respostas estão no Boletim nº 59 – Análise pela equipe de especialistas, o Centro de Inteligência da Carne – CiMeatdá Embrapadivulgado nesta semana, trouxe dados sobre a produção brasileira de carnes.
Com exceção das pessoas ligadas ao agronegócio e, em especial, às ligadas à pecuária, grande parte da sociedade brasileira não sabe como o Brasil passou de importador de carneincluindo carne bovina russa na década de 1980 (mesmo com o recebimento de um carregamento suspeito de contaminação radioativa da usina de Chernobyl), à posição de maior exportador de carne bovina do mundo.
Uma evolução desse tamanho aconteceu às custas da floresta amazônica? Não, obviamente não. Isso foi resultado de uma mudança sistemática baseada no aumento da produção e melhoria da produtividade observada no aumento da eficiência em todos os elos da cadeia da pecuária de corte, com pesados investimentos em pesquisa, com ampla disseminação do binômio braquiária/zebu na região subtropical. do Brasil Central, com a dedicação inédita de produtores rurais destemidos que acreditaram na vocação do solo brasileiro para o agronegócio e também no apoio governamental, que de uma forma ou de outra ajudou na interiorização da pecuária, no reconhecimento do produto nacional que junto culminou na revolução vista hoje de sul a norte e de leste a oeste neste país continental. Na verdade, a questão do gigantismo é, talvez, o motivo pelo qual a sociedade desconhece a carne bovina que consome.
A carne bovina é tratada como commodity, ou seja, é, presumivelmente, comercializada indiscriminadamente ou, como diz o jargão popular, vendida como “bica run”. Agora, se conceitualmente deveria ser, na verdade não é verdade. Se a carne bovina é diferente ou tem características específicas dependendo da localização anatômica dos cortes no mesmo boi, você imagina se seria a mesma se fosse de dois bois diferentes? Ou se vem de um boi quando comparado a outro vindo de uma vaca? Quem dirá que será o mesmo se vier de bois criados de maneiras diferentes? A carne bovina criada no bioma Amazônia, na região Norte, produzirá carne semelhante à carne bovina criada no bioma Pampa, na região sul?
Utilizando dados da pecuária nacional (Relatório Beef. Perfil da pecuária no Brasil 2022), tentaremos caracterizar a carne brasileira e mostrar à sociedade como essa carne é produzida.
O rebanho nacional em 2021 era da ordem de 196 milhões de cabeças, das quais cerca de 39 milhões foram abatidas (cerca de 20% da mão de obra), o que gerou cerca de 10 milhões de toneladas de carne. Dessa quantidade, os brasileiros consumiram cerca de 75%, ou seja, a população brasileira consumiu cerca de 100.000 bovinos por dia e cada brasileiro consumiu algo em torno de 34 kg de carne por ano.
Em números redondos, oito em cada dez bovinos abatidos são consumidos pelo mercado interno, vale ressaltar que esses outros dois bovinos são exportados e geram consideráveis divisas para o país, sendo fruto do esforço conjunto do governo brasileiro ao abre mercados, dos produtores quando preparam os animais de acordo com a demanda e dos frigoríficos quando atendem às normas sanitárias e preparam os cortes de acordo com as exigências dos países importadores. Quem abre o mercado é o governo, quem produz são os produtores e quem vende são os frigoríficos.
E de onde veio essa carne que era consumida pelos brasileiros? Esta é uma pergunta muito complexa, mas vamos respondê-la de forma simples, pensando no passado e fazendo algumas suposições que, com meia dúzia de perguntas e evidências, seriam facilmente comprovadas como irreais. Mas eles serão úteis para o propósito deste exercício.
Assumindo a carne bovina como commodity, que a produtividade da pecuária brasileira seja uniforme em todo o país, que não haja diferença entre boi e vaca, que todas as raças sejam iguais, que a produção dependa única e exclusivamente do gado e que, infringindo todas as leis de logística, a carne é distribuída uniformemente por todo o país.
Assim, continuando o exercício de caracterização da carne consumida pelo povo brasileiro, podemos dizer que para cada 100 animais consumidos pela população brasileira, 35 animais são da região Centro-Oeste, 22 da região Sudeste, 16 da região Sul, 14 do Norte e 13 do Nordeste
Assumindo que o binômio braquiária/zebu é predominante em todo o Centro-Oeste, em grande parte do Sudeste, em grande parte do Norte, na região do Matopiba e no Paraná, não seria exagero dizer que cerca de 75% dos animais abatidos têm genética zebuína (principalmente Nelore) e comiam capim-braquiária, ou seja, 3 em cada 4 kg de carne consumida pelos brasileiros é, muito provavelmente, de zebu que comeu braquiária.
Colocando no contexto biológico do binômio braquiária/zebu e que os animais sofrem os efeitos da sazonalidade climática, eles só podem chegar ao ponto de abate com pelo menos 3 anos de vida. De acordo com as estatísticas de abate, cerca de 40% dos animais abatidos são fêmeas, com predomínio de vacas de descarte, é fácil chegar à conclusão de que o brasileiro, ao consumir carne, esta carne é proveniente de animais criados a pasto. Este seria o modal pecuário brasileiro por algumas décadas, constituindo a chamada pecuária tradicional.
Por outro lado, a evolução da pecuária brasileira se deu com avanços em diversas áreas do conhecimento e este modal tornou-se apenas uma referência ao passado. Ou seja, a cadeia tem à sua disposição sistemas que, embora baseados no binômio Brachiaria/zebu, contêm elementos de avanço por meio do melhoramento genético, seja selecionando matrizes e reprodutores superiores para características de interesse econômico, seja direcionando o acasalamento desses animais. animais superiores que buscam complementaridade em fenótipos específicos, seja pelo cruzamento para buscar também a complementaridade entre raças, seja pelo avanço do manejo nutricional como o uso de suplementação alimentar em diferentes fases de crescimento do animal, buscando corrigir deficiências sazonais na qualidade e/ou quantidade dos alimentos, ou ainda por meio de práticas como adubação, manejo e irrigação de pastagens, conservação de forragens e uso de confinamentos.
Assim, a pecuária passou a aplicar uma série de conhecimentos que se tornaram inovação e permitiram o abate de animais muito mais jovens do que a pecuária tradicional, aumentando tanto a produção quanto a produtividade de machos e fêmeas. Isso dificulta a caracterização da carne consumida pelos brasileiros devido à complexidade e variabilidade dos sistemas de produção de carnes adotados no Brasil.
Às vezes o consumidor brasileiro come carne de vacas de descarte com oito anos ou mais de idade, às vezes de touros de 4 anos criados a pasto, às vezes de touros de três anos terminados com suplementação a pasto, às vezes de touros de dois anos terminados em confinamento, às vezes de animais machos ou fêmeas abatidos aos 14/15 meses criados/terminados logo após o desmame em confinamento.
Em resumo, a carne bovina não poderia ser considerada como parte do grupo das commodities, pois, sem dúvida, a carne bovina não é toda igual. Além de a carne brasileira não ser um produto único em termos de processo de produção e padrão sensorial, para complicar, os diferentes sistemas de produção também não conseguem gerar um produto típico, específico para cada um. Os sistemas que entregam um produto com certa diferenciação e uniformidade são aqueles intensificados que permitem o abate de animais com idade de 14/15 meses e com menor grau de sangue zebu, onde a carne apresenta maciez acima da média, mas com coloração menos avermelhada, com gordura externa esbranquiçada, com pouca deposição de gordura interna e às vezes com sabor diferente do tradicional, ou seja, pode ser um produto diferente e macio, mas não do agrado de todos.
Ainda não existem métricas ou análises científicas que possam ser aplicadas e que sejam capazes de diferenciar uma carne da outra, a única ferramenta à disposição do consumidor é o histórico associado ou não a selos de garantia ou certificação, aspecto intangível que pode ser útil para agregar valor e atender nichos de mercado. Seja carne de animais de uma determinada raça, carne de um determinado processo de produção ou carne de uma determinada região. A grande questão é se o consumidor conseguirá identificar diferenciais sensoriais suficientes para fazê-lo valorizar essa carne com selo ou se a valorizará apenas por seus intangíveis, sua história e certificado.
Há precedentes que indicam que o intangível pode valer muito mais do que os atributos tangíveis de um determinado produto. Exemplos de marcas e rótulos supervalorizados em diferentes tipos de produtos são abundantes. Valerá uma foca mais do que os aspectos sensoriais da carne, digamos, a maciez?
Por fim, neste momento, a pecuária brasileira experimenta alternativas para dar mais um salto gigantesco, talvez até maior do que o experimentado na virada do século, o uso massivo da integração lavoura-pecuária proporcionará ganhos qualitativos e quantitativos incalculáveis na produção de nossa carne, fortalecendo ainda mais nossa posição competitiva no mercado global.
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