Hoje, o Brasil já ultrapassa a marca de 35 bilhões de litros de leite produzidos anualmente, sendo a produtividade média do rebanho mais de três vezes superior à registrada há 50 anos. Esse notável avanço na produção e produtividade da indústria de laticínios brasileira é fruto principalmente de pesquisas científicas, que levaram a um aumento de quase 100 litros por habitante nesse período, elevando o consumo médio de leite de 75 litros para 170 litros recentemente.
Pesquisa científica e parcerias público-privadas
A virada na evolução da indústria de laticínios ocorreu com a criação da Embrapa Gado de Leite em 26 de outubro de 1976, na época denominado Centro Nacional de Pesquisa em Gado de Leite (CNPGL). Naquela época, os desafios de pesquisar, desenvolver e transferir tecnologias para uma atividade presente em praticamente todos os municípios brasileiros, com diferentes níveis de tecnologia, eram enormes.
A missão inicial da unidade de investigação era “possibilitar o aumento do consumo de leite e derivados através do aumento da sua oferta”.
O programa de implantação da unidade determinava que os estudos fossem voltados para a implantação de sistemas de produção que permitissem uma abordagem abrangente dos problemas a serem resolvidos pela pesquisa.
Para enfrentar essas questões, em 1977, foi criado o “Sistema de Produção de Gado Mestiço” dentro da Embrapa, com um rebanho de composição genética mista entre as raças Holandesa e Zebu, criado principalmente a pasto, com escala de produção e modelo de exploração de média tecnologia que representava grande parte das fazendas leiteiras do Brasil naquela época.
Além disso, foi implantado o Projeto de Monitoramento Agrícola, um trabalho pioneiro de prospecção de problemas da atividade e transferência de tecnologia. Ações foram realizadas para monitorar o desempenho dos sistemas de produção de leite, inicialmente em propriedades em Minas Gerais e no Rio de Janeiro, e posteriormente em todo o país.
Cruzamento genético e seleção para melhorar raças leiteiras
Foi nesse momento que o foco inicial voltou-se para as raças bovinas, iniciando-se pesquisas sobre o mestiço leiteiro brasileiro e estratégias de cruzamento para produzir uma raça leiteira que reunisse as características de alta produção inerentes ao bos taurus (como a raça Holandesa) com adaptabilidade às condições tropicais, característica da raça Bos indicus (como a raça gir).
Essas bases foram essenciais para os programas de melhoramento animal voltados para a produção de leite em condições tropicais, coordenados pela Embrapa em parceria com as associações nacionais de criadores.
O modelo de parceria público-privada foi um grande sucesso, resultando no desenvolvimento da raça gir leiteira, pioneira em 1985, seguida da raça guzerá em 1994 e da raça girolando em 1997, o que aumentou significativamente a produtividade e permitiu a disseminação de genética superior adaptado às diferentes regiões do país. Além disso, a pesquisa também se concentrou na avaliação genética das raças Holandesa em 2003 e mais recentemente da raça Jersey em 2022.
Profissionalização da cadeia produtiva
É importante lembrar que, até o início da década de 1980, a pecuária nacional não dispunha de critérios objetivos e precisos para a organização da reprodução. Empiricamente, pecuaristas realizam cruzamentos entre animais com características de interesse, como boa produção de leite, mas nem sempre obtêm descendentes com o mesmo desempenho.
Para solucionar esse problema, a Embrapa Gado de Leite traçou o perfil genético dos criadores e organizou o primeiro resumo com o valor genético dos animais, orientando e organizando a reprodução. Essa ação não só profissionalizou a cadeia produtiva do leite ao destacar o valor reprodutivo de cada animal por meio da genética, como também foi pioneira nesse trabalho no país. Mais tarde, apareceram resumos de gado de corte e outras criações de animais.
Outro destaque na atuação da Embrapa Gado de Leite é o melhoramento genético vegetal. Até o início da década de 1980, os sistemas de pecuária no Brasil eram predominantemente extensivos, baseados no uso de pastagens de baixa produtividade e baixo valor nutritivo, resultando em baixas taxas de lotação e baixo desempenho animal. Atualmente, cultivares melhoradas associadas ao manejo adequado das pastagens têm se expandido em todos os biomas do país.
