Por Hyberville Neto – consultor e diretor da HN AGRO
O semestre terminou, e 2023 se confirmou como mais um ano de aumento na oferta de fêmeas destinadas ao abate.
Nos três primeiros meses do ano, o abate de bovinos aumentou 4,8% em relação ao mesmo período de 2022. Segundo o IBGE, foram abatidas 7,3 milhões de cabeças, ante 7,0 milhões no ano anterior.
Esse aumento na oferta está relacionado à redução da rentabilidade dos bezerros desde 2022, o que tem levado os criadores a optarem pelo desinvestimento e pelo abate de vacas e novilhas.
Considerando dados preliminares do MAPA para o abate de bovinos sob fiscalização federal até maio, houve aumento de 8,1% em relação ao mesmo período de 2022.
A oferta de bovinos está maior, o que tem pressionado os preços e, em fevereiro, ainda tivemos a suspensão das vendas para a China por um mês, devido ao caso atípico de encefalopatia espongiforme bovina no Pará.
Após a retomada da China, o mercado ganhou firmeza, mas por pouco tempo, e a pressão do fim da safra chegou, trazendo as fêmeas que foram mantidas nos pastos nos últimos anos. O período de preços positivos até o início de 2022 gerou investimentos e aumento do rebanho na maioria das fazendas em todo o Brasil.
Com isso, tivemos uma pressão de final de safra relevante, mas que também parece ter ficado para trás. Há uma oferta mais enxuta no momento, devido à diminuição da disponibilidade de gado a pasto, associada a um cenário de baixa oferta de gado de cocho, já que a atratividade do confinamento não estimulou essa forma de engorda. Essa falta de estímulo se deu tanto pelos preços dos grãos (até março) quanto pelos preços futuros, que só recentemente se recuperaram, acompanhando a firmeza do mercado físico.
A figura 1 mostra a variação de preços entre janeiro e junho de 2023 e em 12 meses, considerando médias mensais.

De janeiro a junho, o preço do boi gordo caiu 13,3%, enquanto o do boi magro recuou 17,4% e o do milho caiu 36,2%, pelas referências do Cepea para São Paulo.
Em relação ao início do ano, os custos de um sistema de engorda mais intensivo caíram mais do que a receita. Se o sistema adquirir bezerros, a proporção também melhora.
Quando analisamos uma fazenda que usa menos ou não usa ração concentrada e não compra substitutos, houve uma piora direta dos resultados, pois estes estão relacionados aos preços de venda. Na recria e na engorda, existem relações de troca para tornar menos direta a relação entre resultados e preços.
Ou seja, quando os preços do bezerro e do animal terminado caem, a rentabilidade do bezerro e do ciclo completo também cai, se não houver mudança relevante na produtividade. Por isso os produtores de bezerros foram mais abatidos neste primeiro semestre.
E o segundo tempo?
As exportações costumam ter um bom desempenho no segundo semestre. Nos últimos 26 anos, apenas em quatro (15,4%) os embarques do segundo semestre foram inferiores aos do primeiro, em termos de volume. Em média, as quantidades foram 17,9% maiores na reta final do calendário.
A Figura 2 mostra essas variações desde 2011.

As projeções do USDA são de aumento de 3,9% nos embarques de carne bovina do Brasil, em relação ao recorde de 2022.
Segundo o órgão, o Brasil deve representar um quarto do comércio mundial de carne bovina, mais do que Índia e Austrália, segundo e terceiro lugares, juntos. A Austrália ainda é frequentemente impactada pelo El Niño, que está ativo novamente, vamos acompanhar.
A situação de menor oferta de gado nos Estados Unidos e preços elevados, devido à fase do ciclo lá, colabora com o Brasil no cenário internacional. O país é nosso cliente, mas também é fornecedor da China. Carne cara nos EUA beneficia o Brasil dos dois lados.
Falando em mercado internacional, o câmbio é um ponto crucial, que continua no radar.
Para o consumo interno, temos um cenário de inflação mais contida e nível de desemprego melhor do que nos últimos anos.
A situação econômica está repleta de incertezas, relacionadas à política e ao que dela virá. No entanto, os indicadores atuais estão na linha da recuperação face aos últimos anos, com os efeitos da pandemia e da guerra.
Quanto à oferta, a pressão do abate de fêmeas é maior no primeiro semestre. Isso não significa que teremos uma oferta enxuta no segundo semestre, mas a pressão pelo descarte é mais acentuada até o início da estiagem.
Um importante componente da oferta de gado no segundo semestre é o confinamento, atividade que não teve muita quebra do lado da alimentação até abril, quando o milho começou a cair com mais força.
Ao mesmo tempo, os preços futuros do boi gordo também ficaram bastante pessimistas durante a maior parte do semestre, o que afetou a atratividade do gado entrando no cocho e deve manter a oferta de confinamento contida nos próximos meses.
Com a queda do milho e preços futuros um pouco melhores, é possível que haja um volume maior de boi a partir de meados do segundo semestre, mas essa maior oferta já está chegando ao mercado em um período de provavelmente mais forte exportações e melhor consumo interno do último trimestre, o que pode amenizar o impacto sobre os preços.
Em suma, a “conversa”. Estamos em um ano de maior oferta de gado, com recuperação do consumo interno. As exportações devem ajudar e acreditamos que há espaço para o mercado evoluir nos próximos meses, mas sem expectativa de fortes altas.
Gostou desta coluna? Você tem alguma sugestão ou nova informação? Por favor, escreva-me para [email protected].
VEJA TAMBÉM | Boi gordo: boa relação de câmbio e preço futuro ruim
