O desafio é superar as quase 13 milhões de toneladas consumidas hoje no país; antes da guerra, o Brasil descobriu que era preciso aumentar a produção.
O Brasil pode se tornar autossuficiente na produção de trigo para consumo em até dez anos. A afirmação é de pesquisadores da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), que já coletaram resultados significativos em suas pesquisas de campo e os apresentaram na audiência pública realizada nesta quinta-feira (2), na Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA). O desafio é superar as quase 13 milhões de toneladas consumidas hoje no país, hoje 50% importadas.
A audiência foi solicitada pelos senadores Chico Rodrigues (União-RR) e Acir Gurgacz (PDT-RO), responsáveis por discutir os resultados das pesquisas recentes da Embrapa sobre a tropicalização da cultura do trigo e as perspectivas de expansão da produção. para os estados das regiões Norte e Nordeste.
Chico Rodrigues, que destinou R$ 500 mil em emenda orçamentária à Embrapa, disse que continuará direcionando recursos para que sejam feitas pesquisas para atender a demanda do estado de Roraima.
— Os pesquisadores chegarão a resultados excepcionais, dando aos produtores rurais condições de implantar a safra de trigo, expandir. Temos um potencial fantástico, temos certeza de que o resultado será o esperado”, disse Chico Rodrigues.
O senador Carlos Fávaro (PSD-MT) lembrou que diante da guerra entre Ucrânia e Rússia, grandes produtores mundiais, o Brasil descobriu mais uma vez a necessidade de aumentar a produção de trigo.
— Com pesquisas vinculadas a políticas públicas, vamos buscar a autossuficiência — destacou Carlos Fávaro (PSD-MT).
novas fronteiras
Roraima, Ceará, Piauí e Maranhão são alguns dos estados que aparecem como novas fronteiras para o trigo, atualmente produzido majoritariamente na região Sul (90%).
Segundo o chefe-geral da Embrapa Trigo, Jorge Lemainski, 19% do consumo está localizado na Região Sul; 42% na Região Sudeste; 5,5% na Região Centro-Oeste; 22% na Região Nordeste; e 10% na Região Norte, num total de 12,7 milhões de toneladas demandadas.
— Estamos dedicando todos os nossos esforços para aumentar a área de cultivo. Há uma fronteira agrícola a ser explorada nesse sentido. Quando tivermos rentabilidade, o produtor terá que aumentar sua produção – disse Lemainski.
O pesquisador de trigo da Embrapa Cerrado, Júlio Albrecht, mostrou que a área de produção de trigo está migrando para a região do Cerrado.
— Temos, no Cerrado, 204 milhões de hectares e podemos explorar sem derrubar árvores, cultivando apenas em regiões degradadas. A Embrapa sempre acreditou no trigo nesta região. Conseguimos alcançar a autossuficiência e até exportar trigo em menos de 10 anos.
Em termos de custos de importação para o Brasil, o trigo fica atrás apenas do petróleo, segundo Albrecht. A aposta é reunir genética, pesquisa e produtores qualificados.
Além da demanda, o trigo é bem-vindo no sistema de produção por ser uma planta que suprime doenças do solo e de plantas daninhas, além de reduzir a infestação de nematoides (minhocas), fornecer palha ao solo e tornar o sistema de produção mais saudável.
— O Cerrado pode se tornar um terceiro ou segundo produtor nacional de trigo. A produção ocorre na entressafra, estamos próximos ao centro consumidor e hoje colhemos um dos melhores trigos do mundo para panificação. Também estamos alcançando os melhores rendimentos”, explicou Albrecht.
A média nacional é de 2,8 toneladas por hectare, mas em 2021 já havia um recorde com um produtor nacional obtendo 9 toneladas.
Roraima
O chefe-geral da Embrapa Roraima, Edvan Alves Chagas, confirmou que o estado tem mais de 2 milhões de hectares aptos para a produção de grãos e que, mais recentemente, há demanda para a produção de trigo.
O estado enfrenta alguns desafios como baixa latitude e altitude, altas temperaturas e umidade relativa do ar. No entanto, pesquisas da Embrapa apontam bons resultados na produção de trigo.
— Acreditando na ciência e contando com as pesquisas da Embrapa, iniciamos os primeiros testes com o trigo. Os resultados foram muito animadores e as cultivares testadas apresentaram excelentes resultados, com três toneladas por hectare, em um ciclo de 66 dias. Isto é realmente fantástico e permite-nos fazer duas colheitas com este trigo. Os resultados também mostraram que a farinha dos grãos colhidos em Roraima tem boa qualidade para panificação”, disse Chagas.
A produção de trigo tropical em Roraima trará segurança alimentar e fonte de divisas, segundo o chefe-geral da unidade em Roraima, e será uma opção de cultivo após a colheita da soja, que no estado já sofre com a ferrugem (uma doença que afeta a cultura).
O pesquisador também acredita que com o cultivo do trigo será possível atrair indústrias voltadas para a moagem. Também é preciso, segundo Chagas, inserir a cultivar no sistema de produção e estudar outras finalidades para seu uso, além do consumo humano.
— Ainda temos grandes desafios, então o apoio de todos os elos envolvidos na cadeia é extremamente importante para que possamos seguir em frente — explicou.
Em um aparte, a senadora Zenaide Maia (Pros-RN) mencionou o quanto o trabalho desenvolvido pela Embrapa é “inquestionável” para a maior e melhor produção de alimentos do país.
— Precisamos de mais investimento em ciência e tecnologia. Apesar do desinvestimento, a Embrapa se mantém pela persistência – observou o senador.
Produtor de soja do estado de Roraima, Geraldo Falavinha também participou da audiência e se colocou à disposição da Embrapa para realizar os primeiros plantios em escala industrial na região.
situação global
Em todo o mundo, 779 milhões de toneladas de trigo são colhidas hoje. A invasão da Ucrânia pela Rússia – dois grandes produtores do grão – mostrou que pode haver desabastecimento dada a paridade que existe hoje entre produção e consumo, sem excedentes significativos.
— Rússia e Ucrânia respondem por 30% da produção e o contexto de guerra influencia sim nos preços que serão repassados. Esses preços mais altos são um atrativo para o aumento da produção no Brasil — disse o assessor técnico da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Tiago Pereira.
Na safra atual, segundo Pereira, o Brasil atingiu a marca de 7,7 milhões de toneladas de trigo e na próxima deve chegar a 8 milhões. 50% do que é consumido no país ainda é importado, sendo 80% da Argentina.
O aumento da produção nacional deve ser acompanhado pela industrialização, segundo o assessor da CNA, assim como pela organização do mercado e logística. O país tem atualmente 165 moinhos de trigo ativos.
Fonte: Agência Senado
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